segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

GILFRANCISCO SOBRE MÁRIO CABRAL

RENATA MARIA: Pedagoga e Pesquisadora Bolsista da Fundação Biblioteca Nacional. renatamaria.literatura@gmail.com



Autor de quase vinte livros (crítica, história, folclore, poesia, ensaios, contos, romances, memórias), Mário Cabral nasceu em Aracaju em 26 de março de 1914, estudou no Atheneu Pedro II e fez os estudos complementares em Salvador, onde, formou-se em Direito em 1937.Ao retornar a Aracaju, advogou, lecionou dirigiu o Sergipe Jornal, fundou a revista Aracaju e foi seu prefeito. Em 1955, passou definitivamente a viver em Salvador, onde dirigiu o Diário da Bahia, passando depois a colaborar no Diário de Notícias, Estado da Bahia e no Jornal da Bahia.

Antes, de mais nada e acima de tudo, o escritor Mário Cabral é um intelectual, um daqueles poucos brasileiros que ainda se preocupam e insistem em pensar. Coisa rara no país do carnaval nos dias atuais. Mas nem por isso sua obra é conhecida suficientemente pela grande maioria dos brasileiros. Conheci o poeta Mário Cabral, nos idos de 1980 num lançamento na Academia de Letras da Bahia, quando me ofertou o livro de poesia Juízo Final, e logo percebi a sua decidida vocação literária, brilhante e oportuna.Nesse novo livro de versos Cidade Morta, Aracaju, 1ª, 1954. Salvador, Editora Artes Gráficas, 2ª ed. 247 ps. 1998, o consagrado poeta reúne 90 poemas.

A primeira notícia sobre esse livro ainda inédito, data de 3 de fevereiro de 1937, através do artigo Prosa e Verso, escrito pelo crítico mineiro radicado em Salvador, Carlos Chiacchio (1884-1947) que gozava grande prestígio na época, pois mantinha no jornal A Tarde, uma coluna literária, Homens & Obras, de 1928 a 1946 (dezoito anos de rodapés semanais), constituindo um registro constante e praticamente completo de tudo o que de mais significativo aconteceu, particularmente na Bahia, nas áreas da literatura e da arte: “Mário Cabral, um jovem poeta do nordeste, envia-me da cidade de Aracaju, os seus versos ainda inéditos. E deseja uma impressão qualquer. Esplêndidos, eu lhe diria, se um simples adjetivo valesse uma crítica. Mas no seu caso vale. Variedades de metros, dos libertados, à moda nova dos independentes em arte, aos cativos, ao jeito antigo dos clássicos em métrica. E a riqueza cintilante dos temas renovados pelos frêmitos da alegria criadora, valentemente moça, discretamente ousada, equilibradamente forte, que os seus versos revelam, faz que se diga de Mário Cabral, o melhor que se possa dizer, não uma promessa, porém uma esplêndida (lá vem o adjetivo) uma esplêndida afirmação de poeta”.Cidade Morta é um cadente mostruário da poesia a serviço da vida, do homem e da utopia. Uma obra que é surpreendente por sua atualidade e modernidade, onde o poeta, utilizando uma linguagem simples e calorosa, convida o leitor a aproximar-se dos seus primeiros passos nas letras. Cuja poesia violentamente luminosa, das mais “densas” no nosso tempo, faz de Mário Cabral ser sempre uma celebridade crescente.

Graças a esse sensível poeta, feito de forma sutil, sorriso aberto, olhos brilhantes de aracajuano, não deixa dúvidas quanto ao seu estilo real e fictício. Sua obra é um manancial que brota entre rochas adustas em uma alta paisagem fria mas aquecida por um sol poderoso. Uma voz viril, que faz falta em quase toda nossa poesia moderna.Mário Cabral continua avançando sem consultar o corpo se suporta os ímpetos do espírito: fazendo crítica literária, escrevendo cartas aos amigos, além de artigos sobre assuntos diversos para jornais e revistas. Um homem que viveu muito e intensamente, com saber de experiência feito, dar essa lição de entendimento literário e humano aos jovens. Obrigado pela oferta desse livro maravilhoso (Cidade Morta), onde temos a dimensão do vigor do seu espírito, que é bem mais uma parte de sua alma de poeta, pelo respeito e admiração que lhe consagro. Para o poeta que completa, 86 anos de idade, a função do escritor é manter a língua e a imaginação de uma cultura viva, porque sua produção literária é o depositário da consciência e da cultura de um povo.Mário Cabral tem artigos publicados em vários jornais do Norte e do Sul do país, como também, do exterior, Chile, Peru e USA. Faz parte do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia e da Associação Brasileira de Escritores. Sua obra tem sido elogiada pelos maiores intelectuais do país, como, por exemplo, Jorge Amado, Amando Fontes, Érico Veríssimo, Carlos Chiacchio, Luis da Câmara Cascudo, dentre outros.Lição de PoesiaA poesia é o sofrimentosublimado.

A dor íntima,subjetiva, indefinida,tradução da tristeza e do abandono,não compatível com o ser-feliz.A poesia é à noite, o inverno,o vivo de um cão,o guarda-noturno,o mendigo incendiado,a amarga separação.É a magia de um bar,a magia do sonho, da luz ou da fumaça,do martini esquecido sobre a mesa,do piston a gemer de madrugada,da dorida expressão confessional.São os descaminhos e os desencontrosdo amor, do ciúme, da ausência,da incompreensão sem remédio.Todos os poetas cantaram o sofrimentodo homem, seus anseios e suas angústias.Não há alegria em Elliot,Rilke, Baudelaire ou Shakespeare.O verdadeiro poeta quando não sofreinventa o sofrimento.Veste, como uma luva, a roupagemdos famintos e dos desgraçados,dos grandes traídos e dos grandes solitários.- Quem, afinal, já escreveu a poesia feliz ?* Jornalista e professor universitárioFoto: Divulgação


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